Pioneira de Minas Gerais: conheça a história da Turunas do Riachuelo
Campeoníssima na Batalhas de Confete e com 11 vitórias nos desfiles oficiais, Turunas completa 82 anos e é parte histórica das primeiras escolas de samba criadas no país
Repórter
23/01/2016
Depois de errar duas vezes o destino, foi possível avistar, a alguns passos, sob a chuva fina, o grande legado da escola de samba mais antiga de Minas Gerais e a quarta do Brasil: a quadra da Turunas do Riachuelo, no Terreirão do Samba. Incumbido de resumir em 30 minutos os 82 anos de história da agremiação, o vice-presidente, Diomário de Deus, entregava camisas para os integrantes que participam da festa de 50 anos dos Desfiles Oficiais das Escolas de Samba de Juiz de Fora, que ocorre no próximo dia 30, sábado, na praça Antônio Carlos. Ano em que não haverá desfiles, devido a cortes orçamentários do Executivo. Para a data de homenagens, a Turunas faria releitura do samba enredo "Estrela Dalva", que lhe garantiu o tricampeonato em 1976. "É um marco da escola, que será guardado para o retorno na avenida em 2017. Ele foi reconhecido no site da cantora como a homenagem mais bonita feita à Dalva", conta.
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Retomando há oito décadas atrás, o vice-presidente lembra os nomes como Armando Tosch "Ministrinho" e família, José Oceano Soares, Emílio Freitas, Guilherme "Beicinho", entre outros, que fundaram, em 1933, o bloco 'Feito com Má Vontade', na rua Silva Jardim, bairro Morro da Glória. A criação do bloco oportunizou o surgimento de uma matriz de sambas eternos compostos e cantados em cantos do Bar Alvorada, na Andradas. Perto dali, estava o Largo do Riachuelo, junção das avenidas Rio Branco e Andradas, que deu em parte o nome a escola que surgiria um ano depois, em 1934. A outra parte do nome veio da inspiração de um conjunto pernambucano 'Turunas de Mauricéia', que havia se apresentado no Rio.
Antes de 1966 não havia campeonatos oficiais, por isso todos se apresentavam sem enredo próprio. Eram vários sambas entoados nas inesquecíveis 'Batalhas de Confete', realizadas nas ruas Halfeld e Marechal, em que a Turunas se consagrou como a campeoníssima. Diomário conta que as escolas se apresentavam também durante o ano como um conjunto musical em quermesses, em São Paulo e no Rio de Janeiro. "As agremiações tinham alas, mas com nomenclaturas diferentes, como as 'cabroxinhas'. A diferenciação de escola do jeito que conhecemos hoje foi surgir somente na década de 70, por que, até então, o que era luxuoso eram os ranchos", explica.
Enredos marcantes
No primeiro ano de desfiles oficiais, organizado pelo poder público, a Turunas se apresenta com enredo "Homenagem a Belmiro Braga", competindo com as outras duas escolas existentes, que eram Feliz Lembrança e Castelo de Ouro. Confiantes na vitória, os turunenses sofrem com a decepção da segunda colocação, perdendo para o antológico tema "Mascarada Veneziana" de Carlos de Lery Guimarães, da Escola de Samba Feliz Lembrança, sua maior rival das Batalhas de Confete.
Chateada com o resultado, o grupo deixou os desfiles para retornar em 1972, cantando o samba 'Transamazônica'. Na volta a avenida, chamada retorno Feliz, a Turunas fica em 3º lugar e inicia sua nova fase, conquistando o tão sonhado 1° lugar dois anos depois. "A Juventude Imperial seria a campeã, mas o diretor não quis abrir os envelopes, deixando o campeonato para a escola azul e branca, com o enredo 'Lendas e Tradições da Bahia'", conta o vice-presidente, lembrando a soma da vitórias da Turunas do Riachuelo neste 50 anos de desfiles oficiais. "São oito vice-campeonatos e 11 campeonatos".
Ele recorda, ainda, o samba que rendeu duas vitórias a escola, na sua primeira e segunda versão, que foi a 'AEIOUrca', em 1978 e 2012. Em 81, a Turunas tinha um samba chamado 'Viagem Onírica', mas não desfilou pois estava construindo sua quadra. Outro ano histórico foi quando a escola completou suas cinco décadas de história, em 1984, com figurinos de Joãozinho 30. Foram vitórias e derrotas por diversos anos, sendo lanterninha em 80 e 88. Mas, o desfile especial, que marcou foi em 2002 com o enredo 'Atlântida', quando o primeiro lugar foi, realmente, merecido. O investimento grande para a época possibilitou a formação na avenida com 1.400 componentes e oito alegorias. Gigantesco e até difícil de se repetir.
Com certa nostalgia, Diomário acredita que não há nenhum enredo que não tenha marcado uma época ou que não seja cantado. A bagagem profissional também possibilitou uma safra boa dos sambas, que se tornaram músicas populares famosas de Juiz de Fora. Alguns nomes importantes que integraram a escola são Waltencir Barbosa, Aloísio Costa, Silvandiro Fratesch, Lívia Bracher, Paulo Berberick, Zé Kodak, Solange Brand e compositores como Ministrinho, Armando Tosch, Jeova Leal, Mamão.
Baluarte e Velha Guarda
Diomário recorda que da velha guarda da Turunas do Riachuelo ainda se faz presente na escola. Muitas figuras conhecidas prestigiam e prestigiaram por anos afinco a agremiação, como 'Jairo a baiana'. "A nossa cozinheira Maria Lino morreu dentro da quadra em 2013, durante uma festa dias antes do desfile. Ela ajudava muito e conhecia toda a história da escola. Um dia ela vai virar nosso samba", conta emocionado.
Com raiz forte em toda cidade, a maioria dos integrantes são da Zona Sul, por isso a pretensão de deslocar a quadra para a região da cidade. Mas o sonho ainda não tem forma nem projeto. Atualmente, a quadra no Terreirão do Samba passa por uma reforma estrutural para melhor atender os futuros eventos. O espaço construído na década de 80 teve o terreno doado pelo prefeito Melo Reis, que deu prazo de três anos para a construção. "A quadra é um legado para a escola. Algumas pessoas chegaram a vender carro, casa e terreno para construí-la".
A escola se mantém com uma diretoria composta por cerca de 30 pessoas diretas, sendo que o número dobra quando contados aqueles profissionais contratados. Diomário afirma que as condições financeiras não são melhores que outras escolas, como muitos pensam. "Estamos todos no mesmo barco, só que a tradição manda a gente fazer coisa bonita! Em abril será o relançamento no novo enredo e tentamos levantar dinheiro com eventos, almoços e o tradicional Troféu Pipinela para manter a quadra e fazer o desfile. A escola gasta em torno de R$ 250 mil para ir para a avenida e a maior parte da renda depende da diretoria e população apoiadora".
O vice-presidente lembra que além destas pessoas que trabalham durante o ano, são contratados tantos outros em fases de criação das alegorias, figurinos e até para o dia na avenida. "Até a quarta-feira de Cinzas são 400 profissionais contratados de forma direta e indireta, o que resulta na circulação de dinheiro e geração de renda. Do total gasto a prefeitura nos repassa em torno de R$ 64 mil, por isso a maior parte somo nós que arrecadamos. Por isso, é bom lembrar que o dinheiro não fica para a escola, mas é investido no comércio da cidade. Volta para o município".
Projetos sociais
Além da geração de renda, a Turunas também desenvolve projetos sociais para trazer a juventude para as quadras. O vice-presidente lembra que já existiram projetos de aulas de dança e muay thai, mas duraram pouco tempo. "Temos no papel todo o projeto para criar turmas de adolescentes até 14 anos e turmas para mais velhos, que seriam profissionalizados na área do Carnaval, mas devido uma dívida que temos de IPTU não conseguimos buscar patrocínio e aproveitar leis de incentivo fiscal. Sempre que temos oportunidade cedemos a quadra para outras atividades, mas todos dependem de apoiadores".
50 anos sem desfiles
Diomário assume que no primeiro momento a escola ficou chateada com a suspensão dos desfiles. Mas, ao mesmo tempo, a diretoria entende que a Liga das Escolas de Samba de Juiz de Fora precisava passar por uma reformulação e, em consequência disso, as próprias agremiações.
"O carnaval da cidade vem sofrendo perdas, com falta de olhar mais apurado sobre as escolas, que representa geração de renda para o município. Vejo que tudo é prioridade, mas se olharmos com mais carinho para determinada situação, ela acaba fluindo melhor. Vejo que a festa carnavalesca é a soma de blocos, clubes e desfiles, que podem ser considerados um 'teatro móvel'. Por essa qualidade, entendemos que para colocar uma escola de samba na avenida é necessária maior estrutura e investimentos. Acho que a parada também foi boa para que as pessoas sintam falta".
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