Nem tão felizes e não por muito tempo
Mais do que a nudez de Paolla Oliveira, "Felizes para sempre?" parece ter tido a missão de mostrar as imperfeições dos relacionamentos pós-modernos. Com muitos questionamentos, inclusive o expresso no próprio título da minissérie, o enredo conquistou o telespectador, colocando à prova o ideal de felicidade no casamento, que saiu dos contos de fada para triunfar nas obras de ficção seriada televisiva.
Para muitos, a trama de Euclydes Marinho chamou a atenção, não pelos temas tratados, mas pela forma como o autor os abordou. Explico: o adultério, as relações homossexuais, o alcoolismo, a corrupção, entre tantas outras temáticas já são velhos conhecidos do telespectador. Que telenovela nos últimos anos não teve, por exemplo, um personagem infiel no casamento? Neste sentido, quero dizer que, no que se refere aos assuntos tratados, a aclamada série recém-exibida pela Rede Globo não inovou. Mas isto não tira seu mérito, pois há uma fórmula mais ou menos flexível para a concepção de obras de ficção para TV: as histórias de amor - bem ou mal sucedidas - são indispensáveis e há que se tratar sempre da vida privada ou familiar. Não é à toa que vemos tantos títulos de novelas que incluem as palavras "amor" e "família".
Um bom exemplo disso é o já inesquecível Félix, vivido por Mateus Solano em "Amor à vida" (novela de Walcyr Carrasco). O personagem, a princípio se mostrava ambicioso e lutava pela direção do hospital da família, mas, na verdade, tudo o que ele queria era o afeto de seu pai, César (Antônio Fagundes). Ou seja, não se tratava de um objetivo profissional e sim pessoal. O mesmo ocorre em "Felizes para sempre?": a ambientação em Brasília, a temática da corrupção e os locais de trabalho do construtor, do engenheiro, da professora, da restauradora e da médica não servem para enfatizar as aspirações ou dilemas profissionais dos personagens. Eles são apenas cenários para a retratação de suas vidas pessoais, principalmente no que se refere a seus casamentos imperfeitos.
Mas, então, se o que vimos foi mais do mesmo, qual motivo levou a reações tão efusivas? E por que os telespectadores chegaram a colocar o nome de Paolla Oliveira no topo das buscas do Google no Brasil? Bom, não é preciso ser gênio para responder a esta última pergunta: é claro que as belas curvas da atriz tiveram uma enorme participação nisto, gerando muita repercussão entre os homens, mas também fazendo muitas mulheres declararem, de maneira bem humorada nas redes sociais, que estavam oficialmente voltando para a academia a partir do dia da exibição da primeira cena de nudez da personagem conhecida como Danny Bond.
Sabemos que a programação televisiva também se faz com rostos - e corpos - bonitos, afinal, televisão é imagem. Obviamente há quem refute esta ideia, dizendo que a TV não se faz apenas com imagem, que ela precisa de som e imagem, além de diversos outros elementos inclusos nestes dois pressupostos básicos - e eu me incluo entre estas pessoas. Porém, há que se concordar que, mesmo com a indispensável colaboração do som - seja ele através das decisivas falas dos personagens, da trilha ou dos efeitos sonoros -, sem a imagem, não temos televisão. Portanto, a beleza dos atores conta muito, principalmente para uma atriz que dá vida a uma prostituta de luxo.
Acontece que a repercussão de "Felizes para sempre?" não se deve somente aos atrativos físicos de Paolla Oliveira. Dizer isto seria uma injustiça não só com a própria atriz, mas também com todo o aplaudível elenco. O sucesso da série se deve a uma combinação de enredo bem elaborado, texto criativo e atual, excelente atuação do elenco e produção sofisticada. Soma-se a tudo isto também a beleza dos principais atores, os cenários escolhidos – por falar nisso, que fotografia! - e, acima de tudo, os questionamentos propostos. Para quem não percebeu, cada capítulo da trama tinha um título interrogativo, como, por exemplo, "onde colocar o desejo?" e "quem ama não trai?". Parece ser apenas um detalhe, mas, na atualidade, com todos os ideais de participação do público na programação midiática, é como se os roteiristas da série convidassem o telespectador a opinar sobre as situações mostradas na telinha. E funcionou. Pelo menos não foram poucas as exaltadas opiniões que eu ouvi e li nas últimas duas semanas.
Evidentemente, "Felizes para sempre?" não poderia ter um final feliz, pelo menos não para os protagonistas. E aqui me vem mais um questionamento, pois já não há muitas fronteiras entre as personalidades de mocinha (o) e vilã(o). O grande destaque do seriado, Paolla Oliveira, foi mocinha e foi vilã. E isto é ótimo! É interessante e representa uma relativamente nova tendência da teledramaturgia: os personagens estão se tornando mais humanos e menos caricatos, ou seja, têm suas facetas benévolas e malévolas, carregam consigo, ao mesmo tempo, atitudes de mocinhos e vilões, possuem personalidades complexas, como nós telespectadores. Talvez por isto, os finais felizes não sejam mais tão necessários e, hoje, seja mais fácil aceitar um final feliz para o antagonista, ou até a morte, no último capítulo, da personagem de maior destaque do enredo.
Para concluir, vale à pena pensar que, tão interessante quanto os questionamentos propostos é a dúvida sobre quem realmente matou Denise ou Danny Bond. Para alguns, é certo que foi Marília (Maria Fernanda Cândido), já outros juram que só pode ter sido Cláudio (Enrique Diaz). Para mim, o mais divertido é ficar com a dúvida. Afinal, por que uma série que trouxe tantas indagações teria que preencher cada lacuna das dúvidas do telespectador? Se a obra se propõe a ser questionadora, cabe a nós a resposta ou o cultivo de cada interrogação. E que venham mais séries e novelas nesses moldes.
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Paula Faria é jornalista e mestre em Comunicação Social pela Universidade Federal de Juiz de Fora, além de especialista em TV, Cinema e Mídias Digitais, pela mesma instituição. Também é publicitária pela Faculdade Estácio de Sá e desenvolve pesquisas relacionadas à comunicação, cultura e identidades, mais especificamente sobre ficção seriada televisiva e música popular brasileira
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