Mercado para dubladores é restritoProfissão pode ser exercida apenas em dois grandes centros do país, Rio de Janeiro e São Paulo. Para ser dublador, é preciso ter registro profissional de ator
Repórter
22/1/2010
O mercado para o exercício da profissão de dublador de filmes e desenhos animados é restrito no Brasil. O ofício pode ser desempenhado apenas nas capitais dos estados do Rio de Janeiro e São Paulo, onde ficam todos os estúdios de dublagem profissional no país. De acordo com o dublador juizforano, Francisco Brêtas, o melhor modo de ingressar na profissão é procurar um curso profissionalizante e ir para os grandes centros.
"Não é um meio simples de entrar. É preciso persistência e talento. O caminho é estudar e desenvolver a arte de representar, em escolas de artes dramáticas e grupos de teatro, e nunca desistir. Quem tem um sonho, tem um fôlego a mais para tudo o que faz", afirma. Para ser dublador profissional, é preciso ainda ter registro de ator profissional, expedido pela Delegacia Regional do Trabalho (DRT).
Para a dubladora Maíra Góes, para emplacar na profissão, o candidato deve ter talento, sorte e perseverança. "A dica é ir aos estúdios, conversar com os diretores e pedir uma oportunidade de mostrar o seu trabalho. No início da carreira, a pessoa não dubla muito bem, mas o diretor pode enxergar um bom ator, que tem noção de sincronismo." Segundo Maíra, dada a chance, é preciso que o dublador saiba aproveitar. "No início, o estúdio vai chamar o iniciante para fazer uma pontinha. O importante é não jogar fora a chance de dizer um boa noite, senhor, com interpretação."
Na capital carioca, cerca de 340 dubladores trabalham nos 17 estúdios existentes. De acordo com Maíra, a rotina corrida não permite que os diretores deem muita atenção a iniciantes. "Os estúdios já conhecem os bons profissionais e recorrem a eles. Há também a questão das vozes que são conhecidas do público e dificilmente são mudadas."
Rotina corrida e remuneração
Ao chegar ao estúdio, o dublador tem duas chances para se familiarizar com o texto. "O diretor assiste todo o filme antes e divide as cenas em anéis ou loops de 20 segundos. Então ele diz quem você é, conta um pouco da história e passa o texto para uma lida inicial. O segundo contato com o script é o ensaio e a terceira vez já é a gravação", explica Brêtas. Segundo ele, um dublador experiente grava 30 anéis em uma hora de trabalho. "A dublagem de atores como o Jim Carrey é mais demorada, pois demanda mais interpretação, por causa das caras e bocas."
Segundo Maíra, a remuneração de quem trabalha bastante é satisfatória. Para a dublagem de homevideos (filmes para televisão e DVD, por exemplo) a cada 20 loops a remuneração é de R$ 73*. Para a dublagem de filmes para o cinema, os 20 loops têm valor de R$ 219*. "O dublador de um personagem principal grava cerca de 80 loops por filme. É só fazer as contas."
Diversão e reconhecimento
Para Brêtas, trabalhar interpretando de forma tão peculiar é o grande fascínio da profissão. "Como toda criança tipicamente mineira, passei muito tempo na frente da TV, encantado com as vozes. Criar impostações fortes para personagens de animes [desenhos animados japoneses], vozes caricatas para outros desenhos animados ou formas irônicas de falar, quando se faz um vilão, é muito divertido."
Para Maíra, trabalhar todos os dias com interpretação é o "grande barato da história". "A gente sai de um estúdio de onde acaba de fazer uma vilã, depois vai dublar um desenho divertido. Mais tarde é a hora de fazer a mocinha. É preciso muita versatilidade e esse é um desafio maravilhoso."
Brêtas participa de eventos de animes por todo o país, representando um dos personagens mais queridos dos fãs de desenhos japoneses (animes), o Hyoga de Cisne, de Cavaleiros do Zodíaco. "Os fãs das sagas ficam fascinados e sabem mais do que eu mesmo. Além do Cisne, sou conhecido por ter dublado todos os seriados japoneses antigos, como Jaspion, Changeman, Flashman, Jiban, Jiraia. Tem ainda os filmes como O mentiroso, dublando Jim Carrey, Jake Gyllenhaal em Brokeback Mountain, recentemente, o Aro de Lua Nova para o cinema e por aí vai... É muita coisa."
Maíra deu a voz brasileira à personagem Dori do longa-metragem Procurando Nemo e, desde então, viaja o país com o marido, também dublador, Marcelo Garcia. "Dublo a Keira Knightley em quase todos os filmes, de Piratas do Caribe a Orgulho e Preconceito. Fiz ainda Sabrina, Aprendiz de Feiticeira, Arquivo Morto, American Pie, Grey's Anatomy, O Incrível Huck, Missão Impossível 3, Heroes... Não dá para lembrar de tudo."
Curso
Maíra é professora de um curso para dubladores no Rio de Janeiro. Durante as classes, são dados exercícios de cognição, desinibição e reflexos, durante 15 minutos por aula. O restante do tempo é todo dedicado à dublagem. "Antes de entrar no curso, o aluno é avisado de que para ser dublador profissional é necessário o registro. Para adultos, o curso tem quatro meses, sendo realizada uma aula por semana, de três horas de duração. As crianças têm um mês a mais de aulas."
Segundo Maíra, o mercado é bom para os pequenos. Nos estúdios do Rio de Janeiro, a procura por crianças dubladoras é grande. "A mudança de voz é a grande responsável. Uma criança com nove anos consegue dublar um personagem de sete. Daqui a dois anos, a voz muda e não é mais possível. Por isso, a grande rotatividade."
A dubladora conta que muitas pessoas procuram o curso por curiosidade e como forma de terapia. "Uma de minhas alunas relatou que estava com depressão antes de estudar dublagem. Com as aulas, ela deixou de tomar os remédios e contava estar muito mais feliz e motivada. Fiquei emocionada."
*Os valores foram informados em janeiro de 2010
Os textos são revisados por Madalena Fernandes
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