O inverno das nossas pretens?es
Na verdade nem era inverno (com aquele morma?o durante o jogo e aquela lua ap?s a partida) mas ? como se fosse. O inverno ? tido e havido como a pior esta??o do ano, a que congela a alma e nos deixa mais vulner?veis. E nunca fomos t?o vulner?veis. E jamais sofremos assim, a conta-gotas, por partes.
Primeiro houve a invas?o daquilo que Roberto Drummond chamava de China Azul. Eles vieram de v?rias partes de Minas e foram tomando a parte das arquibancadas a eles destinado. E estavam todos de azul ou de branco com detalhes em azul - o que deu uma uniformidade espetacular. Do outro lado, do nosso lado, o preto e o branco (que s?o as cores do Tupi) n?o predominavam. Desgra?adamente havia muito vermelho e preto, muitos tricolores, Cruz-de-Malta a rodo e tamb?m estrelas solit?rias.
O segundo sofrimento foi no campo. Parodiando Diego Maradona, na derrota argentina por 6 a 1 para a Bol?via, cada gol era uma punhalada na alma.
Mas, isso, talvez, seja do futebol. Durante os noventa minutos n?o temos a no??o de nada, a n?o ser do jogo. N?o h? ali, enquanto a bola rola, previs?o de nenhuma consequ?ncia. A tens?o e a esperan?a dominam, os desdobramentos ficam congelados. S? quando o ?rbitro apita o fim da partida e olhamos pela ?ltima vez para o placar ca?mos na real, entendemos o triunfo ou a desgra?a consumada.
Por conta disso, sa?mos - pelo menos a maioria dos torcedores, aqueles que sabem que o futebol n?o ? um assunto menor - quietos. Somos, sempre, um grupo de pessoas em sil?ncio profundo.
E a? veio o terceiro dos sofrimentos, o maior, aquele dominado pela humilha??o. Pela primeira vez, desde que frequento o M?rio Hel?nio, tive que dar a volta completa nos arredores do est?dio para, ent?o, retomar o caminho de casa pela estrada da Embrapa. Nunca foi t?o constrangedor. Calhou dos cruzeirenses - em azul, predominantemente em azul - estarem descendo em dire??o ao estacionamento principal e n?s, os carij?s - vestidos tamb?m e absurdamente de Flamengo, Fluminense, Vasco ou Botafogo - subindo. O cruzamento se deu de forma bastante civilizada, apesar das diferen?as de aura e esp?rito: eles com ar superior, n?s absolutamente resignados.
O c?u que protege a todos - muitas vezes de forma injusta, desigual - e a lua foram testemunhas desses dois impressionantes expressos humanos. Minha vontade era, nesse cruzamento a que fomos submetidos, abaixar a cabe?a, cerrar os olhos, mas foi imposs?vel, principalmente porque elas, as meninas de Minas, de azul, estavam assombrosamente belas. Nenhuma surpresa: as mulheres das Gerais ficam ainda mais belas depois de uma grande vit?ria.
Quando passou o turbilh?o, naquele instante de al?vio, de n?o ter mais que encarar os cruzeirenses, pensei numa frase de Eduardo Galeano: "nunca seremos afortunados". Um clube que perde de sete numa fase decisiva de um campeonato (ou que perde de tr?s para um time como o Crici?ma, quando podia perder de dois) mostra perfeitamente qual ? a parte que nos cabe nesse imenso latif?ndio que ? o futebol.
Ailton Alves ? jornalista e cronista esportivo
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