Imediatismo da vida e ideal romântico geram casamentos pouco duradouros O casamento é visto como um grande espetáculo. No dia a dia, personagens que assumiram papéis para vivenciar o enlace vão embora e ficam pessoas comuns

Aline Furtado
Repórter
14/1/2012
Coração partido

No tempo em que a velocidade dita a vida da grande maioria das pessoas, quando tudo precisa ser resolvido com rapidez, desde as refeições, por exemplo, até assuntos profissionais, o que se tem visto são casamentos com duração cada vez menor. O fato ocorre mesmo com muitas pessoas ainda perseguindo a ideia vendida pela máxima 'felizes para sempre', presente em filmes românticos.

"Atualmente, tudo é formatado pela emergência porque vive-se em um mundo capitalista. Com os matrimônios não tem sido diferente. E, caso se queira algo rápido, o consumo é efetuado na mesma proporção", destaca a psicanalista Maria José de Mendonça.

Outro fator que parece influenciar no tempo de duração dos casamentos é o ideal romântico, algo histórico. "Os indivíduos acabam fazendo escolhas frágeis porque são guiados por sonhos idealizados. Tem-se a ideia de que tudo irá se resolver caso o enlance seja estabelecido. É como quem tem o costume de afirmar que tudo vai mudar porque conseguiu um emprego novo, que tudo vai melhorar porque o salário aumentou e por aí vai. Vida a dois deve ser decisão e não solução."

Movida por um ideal romântico, uma jovem juiz-forana, que preferiu não se identificar, casou-se após nove meses de namoro. O casamento durou ainda menos, oito meses. "Sempre tive vontade de casar e ele também. Queria ter a minha casa, vivendo uma via a dois." Mas, já no primeiro mês de casamento, ela começou a perceber no companheiro atitudes que não a agradavam. "Quando namorávamos, não consegui identificar porque vivíamos em casas diferentes. O convívio acabou me mostrando coisas ruins."

Ainda assim, a jovem tentou levar o relacionamento adiante. "Embora tivesse o sonho de me casar, sempre ouvi relatos de que vida a dois é difícil. Então, o fato de ser recente fez com que eu tentasse 'segurar' um pouco, a fim de que não me precipitasse na separação. Pensava em casamento para a vida toda. Até chegar a um ponto em que não aguentava mais. Aí precisei ser firme. Não estava feliz."

Frustração

Diante do ideal romântico, o risco de frustração é grande quando se percebe que aquele homem ou aquela mulher é como qualquer outro e não têm nada de príncipe ou princesa encantados presentes nos contos de fadas. "Nesse casos, a saída acaba sendo a separação, já que não houve planejamento, o que faz com que não exista sustentação. O casamento é visto, pela maioria, como um grande espetáculo. Assim, no dia a dia, as personagens que assumiram papéis para vivenciar o enlace acabam indo embora e ficam, no lugar, pessoas comuns", explica Maria José.

Para a psicanalista, para que o casamento deixe de ser visto como uma instituição falida, é preciso encará-lo como um empreendimento. "É preciso saber administrar, tendo como base amor, admiração, tesão, esforço, perseverança, concessão e respeito." A dica seria harmonizar. "O comportamento no casamento deve ser como em uma empresa, onde os dois envolvidos devem trabalhar os impasses e as diferenças. A palavra renúncia deve ser trocada pelo termo concessão."

Em casos em que o casal namora há anos e o casamento dura pouco, segundo Maria José, o que geralmente ocorre é que as pessoas costumam estar juntas sem verdadeiramente construir uma relação. "É preciso que haja uma aproximação, que é o dia a dia do casamento, para haver, em seguida, a ruptura, a separação."

A mulher como responsável

Segundo a especialista, algumas mulheres são responsáveis pelo afastamento dos seus companheiros. "Algumas confundem independência econômica com independência afetiva. Com isso, o que se vê é uma briga entre dois homens, sendo que o homem da relação acaba se sentindo fragilizado diante de uma mulher tão masculinizada no quesito sentimentos. Existe o risco da falta de respeito."

Jogos de interesses

Alguns casamentos podem ter como base jogos de interesse, inclusive o interesse de amor. "Esse é outro fator capaz de desencadear a frustração e, consequentemente, a separação. Casar apenas por interesse financeiro ou por interesse de amor não resolve. É preciso que haja uma construção, afinal casamento é um elo, um trato. Não adianta casar por pressão ou apenas para fechar uma lacuna. Vejo muitos casais de namorados que vivem bem esta situação quando decidem construir algo juntos, seja a compra de um carro ou de móveis, por exemplo."

Vale a pena continuar?

Para saber se vale a pena continuar em uma relação que começa a dar sinais de que não vai bem, é preciso, segundo a psicanalista, prestar atenção aos sinais. "O imediatismo da vida faz com que os envolvidos sequer percebam os sinais. É como se passassem do sinal verde para o vermelho, sem o amarelo intermediário." Para identificar sinais, Maria José afirma que é importante que cada um pergunte a si mesmo sobre as suas atitudes, tentando reformular o que não está correto.

"São perguntas que têm a ver com a história e a personalidade de cada. Não se deve culpar o outro apenas, fazendo-se de vítima e apontando o algoz. Isso faz com que não haja entendimento sobre os erros de quem aponta apenas."

Empreendimento próprio

Se o casal percebe que os projetos de vida são distintos, é interessante que cada um siga seu caminho, cuidando do seu empreendimento. "Trata-se de uma perda, já que o casal está deixando o investimento feito no casamento. Por isso, é importante vivenciar o luto, que é uma perda necessária, assim como o bebê que deixa a fralda ou a chupeta."

Para a jovem que ficou pouco tempo casada, este momento foi decisivo. "Fiquei por cerca de nove meses depois da separação sem querer me aproximar de outro homem. Precisava resolver as minhas angústias antes de me envolver de novo", relata ela, que, atualmente, namora há seis meses.

De acordo com a psicanalista, o luto permite que as lembranças sejam arquivadas e o foco seja direcionado a novos interesses. "Somente revendo os erros que desencadearam problemas anteriores é que é possível recuperar uma nova vida e outras formas de amar."

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