Bullying sai do ambiente escolar e fica cada vez mais comum no meio virtual Praticado, na maioria das vezes, por adolescentes, o cyberbullying pode ter início como uma brincadeira de mau gosto e evoluir para uma série de calúnias

Aline Furtado
Repórter
10/11/2010
Pessoa teclando

As facilidades proporcionadas pelos avanços tecnológicos, como a internet, são grandes, entretanto, o lado que expõe pessoas e facilita crimes vem sendo ressaltado por especialistas como mudanças provocadas pelas novidades.

"O bullying sempre existiu e sempre vai existir porque é mais uma forma de violência. Contudo, nos últimos anos, o modo como essa violência é exercida tem crescido e se tornado mais cruel, devido ao avanço da tecnologia. Neste caso, temos o cyberbullying", explica a escritora e psiquiatra, Ana Beatriz Barbosa Silva.

Segundo ela, que é autora do livro Mentes perigosas nas escolas - Bullying, os autores do cyberbullying, principalmente adolescentes, usam as redes sociais para desenvolver uma espécie de massacre com relação às vítimas. "É uma verdadeira avalanche de calúnias e difamações, que pode começar como uma grande brincadeira de mau gosto, como uma montagem com fotos, usando rosto e corpo de diferentes pessoas, até a divulgação de filmes pornográficos."

Ana Beatriz ressalta que o caráter de crueldade deve-se ao fato de os agressores considerarem a possibilidade de anonimato. Entretanto, ela lembra que já existem entidades que atuam na identificação, localização e punição de quem pratica, assim como na inibição e na coibição dos atos, como a ONG SaferNet Brasil, que visa à proteção dos direitos humanos na internet.

As agressões disseminadas em meio virtual são caracterizadas como bullying porque apresentam as três características que o identificam. Uma é a repetição. "Para ser considerada bullying, a agressão deve ser recorrente, ocorrendo no mínimo três vezes, o que se aplica à internet, quando as postagens se replicam em alta velocidade, ganhando, muitas vezes, caráter viral."

Outra caraterística do bullying é a intencionalidade, que determina como foco a humilhação e a agressão. "Quando alguém divulga, na rede, mensagens ou imagens que pretendem ofender outra pessoa, a intenção está clara." E, por último, a terceira característica aponta a incapacidade de reação por parte da vítima. "Os agredidos geralmente são pessoas reservadas, que não têm o perfil de quem responderia à agressão sofrida. Quando falamos de internet, como fazer frente se o conteúdo está ali, à disposição de todos?", indaga Ana Beatriz.

Da escola à universidade

Definido como toda violência que ocorre, primeiramente, em âmbito escolar, o bullying pode abranger níveis que vão desde o jardim da infância até o final de cursos superiores. "Um bom exemplo de bullying é o ritual de passagem para a universidade, definido como trote, no qual os estudantes são humilhados e, às vezes, até agredidos." A especialista lembra que as agressões em ambiente escolar podem ocorrer de três formas. Uma seria entre os próprios alunos. As outras seriam entre professor e aluno e entre alunos e professores.

Vítima x agressor

Os pais devem ficar atentos às atitudes e ao comportamento dos filhos. A psiquiatra explica que as vítimas se apresentam como pessoas tristes, isoladas do meio social e que se sentem mal constantemente. "São crianças e jovens que nunca recebem ligações de amigos e que nunca são convidados para sair com a turma." De acordo com Ana Beatriz, é mais comum que os pais da vítima percebam o problema, diferentemente dos pais dos agressores.

"No Brasil, tivemos três casos de bullying que resultaram em mortes. Eram adolescentes que sofriam agressões e retornaram à escola para matar pessoas."

Isto porque o agressor tem características de pessoa bem entrosada com os outros, são populares e participam de grupos sociais. "Isso faz com que os pais ignorem o problema quando a escola emite qualquer tipo de reclamação com relação ao aluno, por exemplo."

A especialista afirma que uma das medidas adotadas no ambiente escolar é colocar agressor e agredido frente a frente, a fim de que façam as pazes. "Não há nada pior do que isso. Em casos assim, o agressor acaba por sair fortalecido porque as ameaças continuam e podem extrapolar os muros da escola. Então, as agressões passam a ser feitas na esquina, no shopping etc."

O ideal, segundo Ana Beatriz, é que professores, alunos e funcionários da escola sejam mobilizados em prol da definição de uma política que combata a prática. Se o problema não puder ser resolvido com a ajuda da comunidade acadêmica e dos pais, a dica dela é buscar auxílio do Conselho Tutelar. "Se, ainda assim o caso não for resolvido, deve-se procurar os delegados que atuam junto à defesa da infância."

Transtornos podem levar à morte

Por se tratar de uma forma de violência contínua, em que o agredido teme revelar o problema, muitas vezes, devido às ameaças feitas pelo agressor, o bullying pode acarretar uma série de problemas de saúde.

A curto prazo, podem surgir sintomas psicossomáticos, como diarreia, náuseas, vômitos e tonturas, todos relacionados ao momento de ir à escola. "Crianças que estudam no período da manhã tendem a começar a passar mal no domingo à noite. Isto porque existe recusa quanto à ida à escola, o que pode provocar desinteresse e fobia escolar, além da queda no rendimento."

A longo prazo, o quadro pode evoluir para pânico, ansiedade, depressão, chegando até a casos de homicídio e suicídio. "No Brasil, tivemos três casos de bullying que resultaram em mortes. Eram adolescentes que sofriam agressões e retornaram à escola para matar pessoas. No interior de São Paulo e da Bahia, inclusive, eles cometeram o homicídio, matando-se em seguida."

Valorize o talento

Uma das formas de combater o bullying é a adoção de medidas educacionais que valorizem o respeito às diferenças. "É possível ser competitivo, mas, para isso, não é necessário agredir o outro. Existem pessoas que têm talentos para alguma coisa e outros que têm para outra." Ana Beatriz lembra que o talento deve ser visto como cartão de visita de cada um, o que pode contribuir para a manutenção da autoestima.

Cartilha

No último dia 20 de outubro, foi lançada, pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), uma cartilha nacional de combate ao bullying, baseada no livro de Ana Beatriz Barbosa Silva. A intenção, segundo a autora, é informar os adultos com relação aos problemas de agressividade.

De acordo com Ana Beatriz, no próximo ano, será realizado um concurso, que irá premiar crianças e adolescentes em doze categorias. "Vamos incentivá-los a auxiliar no trabalho de combate ao bullying." Entre as modalidades de produções estarão teatro, música, grafite, poesia, vídeo, entre outras.

Os textos são revisados por Thaísa Hosken


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