Água de coco
Ainda que o cantor e compositor de sucesso comercial, Naldo Benny, diga que vodka ou água de coco, para ele tanto faz, ouso discordar. Vodka para a noite. E água de coco para curar a ressaca, depois de tomar a bebida mais consumida pela população russa e que apresenta cerca de 40% de teor alcoólico, o que não é pouca coisa, diga-se de passagem. Foi mais ou menos nessa pegada que se encontrava a minha cabeça (como doía!), quando voltava em um domingo escaldante de carona de Teófilo Otoni. Uma bela ressaca de vodka, acompanhada de cansaço e de uma incrível pratada de feijoada (?), antes de sair pela BR-116 em uma estranha rota até Viçosa, onde deveria pegar um ônibus para Juiz de Fora e, enfim, chegar em casa. Com sorte, esse desfecho aconteceria no início da madrugada, já na segunda-feira.
Mas e a água de coco? A água de coco ainda não havia sido apresentada e eu estava ficando com a garganta completamente seca, quando avistei o oásis na beira da estrada, ali na altura de Frei Inocêncio. Estava quente demais. Em letras mal escritas, ainda mais embaralhadas com a sede e a ressaca, em uma placa pra lá de improvisada, avistei com minha total atenção: COCO GELADO 5,00. Como bom caroneiro, fico sempre a mercê da vontade do condutor, mas, a ocasião pedia proatividade e solicitei ao dono do carro uma parada estratégica para tomar uma água de coco gelada. Não houve contratempos. Ele também topou. Estava calor para todo mundo naquelas paragens. Mesmo para quem não bebeu vodka na noite anterior...
Ao descer do carro, um velhinho simpático apareceu de imediato. Já sabia o que a gente queria. "Vieram tomar água de coco, não foram? Esse cartaz nunca falha...", gabou-se o senhor, após nosso aceno positivo de cabeça. "Agora só me digam uma coisa: querem na fruta ou na garrafinha?"
Não pestanejamos na escolha. "Vai na fruta mesmo!" O homem de cabelos brancos mostrou uma adversativa no rosto. Cofiou a barba rala do queixo e soltou. "Vou ser muito honesto com os rapazes. O coco está quente. Acabei de colocar na geladeira agora e não deve ter dado tempo de gelar", admitiu. E completando, "Já o da garrafinha... Esse está muito gelado..."
Dando uma manjada no estabelecimento, uma pequena varanda mal-ajambrada, fiquei na dúvida em relação às condições de higiene, em relação ao envase da refrescante bebida. No entanto, a honestidade apresentada pelo camarada foi determinante para efetuar a escolha. Decidimos por pegar as garrafas geladas que, inclusive, eram mais caras, dado que o conteúdo era maior. Com tamanha secura na garganta, quanto mais água de coco, melhor, concluímos.
E, desta forma, ganhamos a estrada. Com sacolinha para viagem. Até canudinho ele nos forneceu. Saímos elogiando a simpatia do senhor até abrir a garrafa, já na estrada, que era para não perder tempo, e dar a primeira golada. Rolou um estranhamento, confirmado também pela segunda e terceira vez que levei a garrafa na boca. "Sua água de coco também está com gosto de soro caseiro?", perguntei ao meu colega. "Bem que eu estava achando alguma coisa estranha..." Demos mais algumas beiçadas na água para confirmar o infortúnio e jogamos fora, não sem proferir xingamentos. O mau humor durou mais ou menos até passar por Vermelho Novo, quando, enfim, compramos garrafas d'água. Como aquele simpático senhor pode fazer aquilo? – Em um misto de clichê e ditado popular, concluímos: as aparências enganam...
Juliano Nery acredita que Minas Gerais é mais que um Estado. É um estado de espírito. Frei Inocêncio pode ser encontrada na latitude 18° 32' 42" S e longitude 41° 55' 19" O
Juliano Nery é jornalista, professor universitário e escritor. Graduado em Comunicação Social e Mestre na linha de pesquisa Sujeitos Sociais, é orgulhoso por ser pai do Gabriel e costuma colocar amor em tudo o que faz.
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