Feliz Natal e boas... compras?
Aproveitando este espírito natalino que sorrateiramente vem invadindo nossas vidas nestes últimos dias, dedico este espaço para que hoje possamos refletir sobre o sentido desta festividade.
Cena clássica: Ruas lotadas, sacolas e mais sacolas (plásticas, aquelas malditas). Pessoas mal-humoradas se esbarrando nas avenidas. Cartões de crédito apitando para todo lado. Um trânsito desafiador. Pisca-pisca, din go bel e muitas compras. Shoppings lotados, lojas com todo tipo de apelo ao consumidor, que por sua vez não se faz de tímido, se rende. Mas afinal, o que é o Natal?
Não quero aqui descrever pontos de vista religiosos, porque no fim das contas, todos os que possuem ou não alguma religião, sentem que esta época do ano DEVERIA ter um sentido, que não é este regado a consumo, consumo e mais consumo. Paira em nosso subconsciente a percepção – ingênua ou não – de que Natal é uma época em que nos reunimos sem pressa com aqueles com quem temos afinidade, especialmente nossos familiares. Estamos mais propensos a ser pacientes, a desejar coisas boas, a celebrar uma noção razoável de paz. Sei que existem aqueles que ficam tristes no Natal, afinal, existe sim uma certa sensação de nostalgia ou de sentimentalismo puro e simples. Mas talvez devêssemos aproveitar isso e ampliar a nossa emotividade de modo que nossa boa-vontade alcance uma noção de mundo mais abrangente. Isto soou feliz demais? Me perdoem, é o espírito do Natal...
O que não concordo, definitivamente, é que o Natal se resuma a sacolas, roupas, sapatos, bijuterias mais e mais alienação. Mesmo sendo Natal, o mundo continua gritando por socorro, irritadíssimo com nossos abusos. Os mares continuam poluídos, os ecochatos continuam sendo injustiçados e os animais continuam sendo abandonados e deixados de fora da nossa esfera de consideração moral. As experiências macabras continuam acontecendo dentro dos laboratórios usando coelhinhos, ratinhos, macaquinhos, cachorrinhos e gatinhos. Muitos animais nesta época do ano preenchem ainda um outro nicho, recebendo uma nova e não menos deprimente classificação: são categorizados como "presente de Natal". E quando o Natal acabar, vamos estar cheios de sacolas, cheios de animais, que de fato não queríamos. Cheios de dívidas e de mau-humor. Não sei você, mas quando dedico alguns segundos da minha existência para refletir a respeito desta festividade, não é isso que o meu lado idealista desenha como sendo o Natal perfeito...
Talvez devêssemos agora, aproveitando que ronda um sentimentalismo natalino perto de nós, refletir de novo, e mais um pouco e um pouco mais. Talvez devêssemos presentear nossas florestas, conferindo às nossas jabuticabeiras, ipês amarelos, quaresmeiras e jacarandás o status de "árvores de Natal" e protege-las e celebrar a maravilhosa existência que elas encerram. Talvez pudéssemos presentear nossos rios e mares com muito menos lixo e nossas cidades com menos "restos de Natal". Quem sabe não substituímos aquela imagem grotesca de um leitão sobre a mesa ou aquele "peru de Natal" infeliz por algo menos sarcástico... e mais ético? Poderíamos usar nosso rico dinheiro em prol de atitudes menos egocentradas celebrando o anticonsumismo, investido em ONGs, pessoas e projetos que suam para nos oferecer um mundo melhor e Natais menos incoerentes. Talvez... afinal de contas, "então é Natal, e o que você fez?"
Juliana Machado é Bióloga, mestre em Ciências Biológicas - Comportamento e Biologia Animal - UFJF/MG. Doutoranda em Bioética, ética aplicada e saúde coletiva - UFRJ/UFF/UERJ e Fiocruz.
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